SANKOFA - Foi então que eu olhei para trás, vi tudo aquilo que eu jamais deveria ter sido, e nem queria ser.



Bordado à mão (Jonas de Jesus)

SANKOFA
Foi então que eu olhei para trás, vi tudo aquilo que eu jamais deveria ter sido, e nem queria ser.


          Nem por morte, nem por doença.
          Eram essas as palavras que minha mãe usava, quando não queria mais discutir um determinado assunto, coisa de gente opiniosa, sabe? Eu também herdei dela, essa palavra em minhas ações. Por muito tempo.
         Até que um dia, tomei uma rasteira da vida, sentei lhe a bunda no chão, aliás, que chão, pois até este foi perdido numa noite escura, tão preta como um carvão. Esperneei de um lado para o outro, sem encontrar direção, me afobei, de medo, é verdade. Mas foi só o tempo pra eu parar o esperneio, e me colocar em estado de atenção. Foi ai que vi em minha mente, tudo aquilo que não remetia à um sujeito de boa ação. Esse negócio de boa ação, também não faz muito sentido não, afinal de contas, o que é ter boa ação, quando se está com fome, sem nenhum tostão furado no bolso, para alimentar a fome de uma nação? 
        Mas esse não era o meu caso. O que vi, diante da vergonha que não era alheia, e sim minha própria, foi uma escrotice medonha, de um sujeito opinioso, orgulhoso, e cheio de verdades esparramadas, aos quatro cantos do meu mundinho, minúsculo de pura ignorância. 
        Foi preciso, o cortar de minhas asas, essas belas penas, que em outro momento de vida me levou, por tantos ares, para eu decifrar,  o mal que eu cometi, e nem foi aos outros, mas a mim mesmo. A pior ignorância, não é a do que não consegue decifrar um palmo à sua frente, mas sim, aquela de quem se acha melhor, mais sábio, ou mais puro, do que todo mundo.
        Não foi ninguém que cortou, minhas belas asas (que saudades delas), fui eu mesmo, que às depenei. Como foi isso? Foi simples. Foi só fechar os olhos, e olhar para dentro de mim mesmo, olhar para as atitudes que tomei, para a ações, para as agressões que cometi, e fui acometido, que impulsionei e fui impulsionado, olhei para dentro de toda essa grande merda, e vi o grande covarde que eu era, o grande medíocre que me tornei, que de grandioso, só havia a mentira, que eu era, até aquele momento.
          Foi duro. É vergonhoso, sim. E eu precisava fazer algo para mudar. Foi então que eu olhei para trás, e vi tudo aquilo que eu jamais deveria ter sido, e nem queria ser. Eu precisava de cura, de ser curado, pois, lá no fundo da minha verdade mais pura e sincera, eu ainda queria voltar à ser um curador, trabalhar para a luz e ser a criatura, que desejou o criador.
         Há uma diferença em Querer e Ser. Quem É, não quer SER, simplesmente é, por isso, eu não quero mais, ser um curador, pois já sou, desde muito tempo. Como também, não quero mais me construir em nada, pois SOU um ser em construção, em transformação e em vigília de mim mesmo.


Jonas de Jesus, 27 de Maio de 2019.








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